segunda-feira, 24 de agosto de 2009

felinidade


Era um par de mãos quentes que o envolvia; cobertas de calor, afeto, descomedimento. Os pelos negros ouriçavam, sua manhosidade fraca dava margem à dúvida: seria um miado ou um leve ronronar? As mãos seguiam segurando o seu torso enrijecido, mas suas orelhas pontudas dobravam-se em sintonia com as patas. Seu dono - dono das mãos aquecidas - esboçava um sorriso, contentamento de quem busca reciprocidade. E assim apertava com mais firmeza, intensificando no gesto a intenção. Não percebia que o gato não queria afago, tampouco se sentir aprisionado; não notava as garras afiadas que arranhavam o estofado e ameaçavam se deslocar em direção ao calor, à vermelhidão da carne. Não percebeu que os olhos aguçados e acesos do animal miravam outro objeto de desejo. O gato, pobre gato... só queria de corpo e alma alcançar o leite fresco no pires, tão distante de si.