
O vento gélido não me fez parar, tampouco a braveza da chuva. Foi um livreiro manco que diminuiu os meus passos e desviou o meu olhar. Ali, sentado sob uma velha marquise, cercado de livros, ali estava o livreiro manco. Sorriu seu sorriso afiado, eu não soube bem como responder. Sentei-me ao lado dele, perguntei seu nome; o livreiro não quis responder. "Que importância tem um nome?", ele foi logo esbravejando. Estava certo, fui obrigado a ceder. Gatos não têm nome, e sabem exatamente o que são, não? Puxou um baseado amassado, o velho livreiro, não conseguiu acender. Ofereci meu isqueiro, em vão. Cigarro em brasa, e ele se pôs a teorizar. Cuspiu sua filosofia sofrida, e naquele instante eu soube: daquele livreiro manco, eu nada mais podia esperar. Teceu sobre dores e desamores, sobre a pobreza de espírito e o que não se encaixa nesse mundo esculpido em desencaixe. Eu nada disse. O que eram as minhas tristezas diante da gravidade muda que forçava aquela bengala? Terminado o baseado ele me disse alguma coisa, mas o álcool tirou minha atenção. Lembro disso: "rapazes... abjeto... tesão..." Acho que surpreendi o velho livreiro manco, acho que o surpreendi num beijo roubado. Não tendo certeza do que ele havia dito, decidi seguir meu trilho, meu roteiro não-escrito. Me afastei, então, voltando à chuva e ao vento, tal como cheguei. Se tirei lição dessa estória... não sei.