sexta-feira, 3 de setembro de 2010

grass


"Um olhar sobre o muro
Seu jardim já morreu..."

Ao acordar abro as cortinas e me deparo com o gramado do vizinho; gramado ralo, amarelado, entregue ao descaso. Volto meus olhos para os meus metros quadrados. Não vejo grama, e é bem possível que, caso eu visse, seria amarelada e mal cuidada como a grama que separa a vida vizinha à minha. Saio então de casa, tranco a porta com duas voltas de chave, caminho até o mercado e compro algumas flores - às vezes escolho as gérberas, mas quase sempre opto pelos cravos, alaranjados ou vermelhos. Embrulhadas em papel de pão as flores não parecem flores; envolvo nas mãos os caules que ao seu modo sangram, volto à minha porta e com mais duas voltas de chave destranco o meu pequeno jardim de argamassa. Encho uma garrafa vazia de água e deposito ali as flores compradas. Bem sei que em uma semana ou duas estarão murchas, mortas. Bem sei que flores enfiadas em garrafa verde de cerveja não constituem um jardim. Mas não me incomodo, não me entristeço. Se a felicidade existe mesmo, eu sei, ela tem prazo de validade inferior ao dos enlatados que lotam a minha geladeira. E quanto a isso eu nada posso fazer.

"Deixe de ser tão inseguro
A casa está cheia de flores
E você nem percebeu..."